sábado, 20 de abril de 2013

O cara que serviu o rei

contei como consegui 'Eu servi o Rei da Inglaterra'. Só comprei porque tinha esse selo de qualidade:
Uma das encarnações mais autênticas da magia de Praga, numa união extraordinária de imaginação barroca e humor franco, direto.
Milan Kundera

Eu servi o Rei da Inglaterra? Pode comprar! 

A tragicômica vida de Ditie, um ajudante de garçom que tinha tudo para não chegar a lugar nenhum mas chega a ser dono de um hotel e rejeitar uma oferta irrecusável de John Steinbeck, é contada nos longos parágrafos de Bohumil Hrabal, que conseguiu escrever dois livros inteiros com uma frase cada(Esse e esse).

Arrivista, Ditie abraça todas as oportunidades de ganhar dinheiro, seja para gastar com prostitutas, cujos encontros no bordel Paraíso tem descrições bem cruas dos detalhes, seja para espalhá-lo no chão do quarto, imitando um hóspede do hotel.

Como um Thomas Sutpen da Bohemia, Ditie faz tudo para conseguir a respeitabilidade. Junta mais e mais dinheiro para comprá-la. Não consegue.

Com a cabeça na Lua, cobrindo o chão com notas de cem coroas e aprende avidamente com seu mestre, que sabe tudo, pois serviu o Rei da Inglaterra. Ditie tem bons dias, até que consegue servir o Rei da Etiópia(a respeitabilidade, enfim) e ganha uma medalha e perde o mestre.(Como podem ver, ele não conseguiu de novo.)

Aprende alemão, e estranhamente, é o único do restaurante que os atende. Sua pobre namorada alemã, Lise, come sopa fria e os garçons enfiam o dedo em sua comida. Porque será, pensa Ditie. Ah, claro, a Tchecoslováquia está sob ocupação nazista.

Se casa com Lise, que se torna instrutora de ginástica nazista, para ser considerado como um igual pelos alemães e mostrar aos tchecos do que era capaz.

Não consegue. Invejado e ignorado pelos alemães, não necessariamente nessa ordem, porque ele tinha se casado com uma alemã, continua sua vidinha. Os tchecos tampouco iam com seus cornos, já que ele tinha se casado com uma alemã, de modo que ele não valia muito mais que meio salame.

Após vários percalços, compra um hotel para conseguir a respeitabilidade tão sonhada. Não consegue. Seus antigos patrões o ignoram solenemente, devido ao seu passado colaboracionista, e por inveja também. E a vidinha mais ou menos continua mais ou menos da mesma forma.

O livro vai num clima de quase pornochanchada, cheia de alegria e fluidos, nos primeiros capítulos, descambando para um drama bem desgraceira(bem no estilo Dostoiévski), até uma reflexão existencialista no último capítulo que me lembrou muito Camus(Sem pedras, por favor).

Uns trechos para empolgar, ou desistir de vez:

O gordo sorriu olhando para a máquina e disse: A maior empresa do mundo é a Igreja católica, que faz comércio com algo que homem algum jamais viu, homem algum jamais tocou e que homem algum jamais encontrou, desde que o mundo é mundo, e essa coisa se chama Deus.

Aqui, no Hotel Tichota, também aprendi que quem inventou que o trabalho enobrece foram as mesmas pessoas que bebiam e comiam a noite inteira com belas mulheres no colo, os ricos, que podiam ser felizes como criancinhas.

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